O caminho que sigo,
Têm pedras desgastadas.
Mas caminho, e não ligo…
São pedras, para ser pisadas.
Têm como desígnio ser maceradas,
Serem recalcadas no chão.
São pedras de calçadas…
Desprovidas de sensação.
Um propósito humilhante, por elas abraçado…
Mas um propósito… uma razão…
E eu… que me mantenho aqui estático,
Desconhecendo o propósito de meu ser.
Olhando as pedras que piso, com um olhar errático
Sem a sua tenacidade perceber.
Queria como elas ter um sentido,
Mesmo que fosse ser pisado,
Calcado, macerado, e depois esquecido.
Mas não…
Tenho menos desígnio, que uma pedra da calçada.
Valo o que valo… e o que valo é pouco mais que nada.
Sou herói grego, sem beleza, força ou inteligência,
Sem viagens a fazer, ou monstros a derrotar.
Sou prisioneiro de minha vulgar existência,
Que Deus algum ousa transmutar.
Tenho um grande amor em mim, como tinha Orpheu
E iria, como ele, ao Hades, para a salvar.
Galopa em mim a tremenda dor de Prometeu,
Que tal como a ave, de mim se vem alimentar.
Em labirintos confusos, me acabo por perder
Enganado por cavalos deixados á minha porta.
As asas que não tenho, o sol, as faz derreter.
A mim… que ninguém me exorta.
Nas minhas viagens não feitas, nunca vi o Olimpo,
E não passei o Estige, por não ter pago a Caronte.
Nem miragens vi, de um céu limpo,
Ou de algo não trágico no horizonte.
Olhei Medusa, e em pedra me transformei,
Fugindo do Cerberus de meus adormecimentos.
Sem me levantar, me cansei…
Nesta Odisseia de meus pensamentos.
O sol irrompe, na manhã de neblina,
Volvendo costas á noite de negrura cristalina.
Foi mais uma batalha épica por ele vencida,
Em mais um amanhecer de minha vida.
Jazo, inútil, aqui sentado…
A pensar no que ontem me foi lembrado.
Disseram-me que era um inútil, que nada valia
“Não discordei! Como podia?”
Dói tanto ouvir a verdade…
Mas louvo imenso a sinceridade.
E mesmo sabendo, o zero que sou,
Essa “frase-seta” me trespassou.
Porque em determinados dias,
Me escondo em deliciosas fantasias.
Escondendo a inutilidade completa de meu ser,
Evitando o espelho que não quero ver.
Se houvesse remédio para o inútil que há em mim…
Se houvesse um meio, de á inutilidade por fim…
Beberia esse remédio, tomaria esses meios.
Esvaziaria meus membros, de inutilidade cheios.
Perdoa-me sol, por teres de me aquecer…
Perdoa-me por aqui sentado ver mais um amanhecer.
Contar o tempo…
Todos os segundos, minutos, horas, dias, meses…
Não conto o tempo…
Sinto-o passar.
Sinto-o ir, e não voltar.
Sinto dentro de mim as recordações.
Os momentos electrizantes, esperados…
Todos os segundos, desassossegados.
Sinto tudo isto… e muito mais…
Tanto mais…
No frágil passar do tempo,
Tudo acaba por mudar.
A certeza, vira arrependimento,
Quando digo, o que queria calar.
Escrevi, o mundo com outro olhar
Corri, sem ter ido a nenhum lugar
Suspendi, o mundo sem o poder segurar
Vi-me diferente do que é habitual estar.
Senti, algo mais que dor…
Vejo-te como algo superior.
Imagem de esplendor…
Por vezes…
Não queria ver, o que meus olhos me obrigam a ver…
Não queria ouvir, os sons que meus ouvidos me teimam em trazer…
Nem sentir o sabor, sem sabor da ausência do prazer,
Ou sentir o cheiro pestilento imanado de meu ser…
Não queria sentir na pele, todo este sofrer.
Imerso no mar do pensamento,
Sonho meu, dorme ao relento.
Por si, passa o tormento…
Desvanecendo em lamento.
Naufragado em dia de tempestade,
Sonho meu, viu calamidade.
Deixou de ser sonho, virou irrealidade,
No inquieto trovejar da verdade.
Caindo desamparado, no vil chão…
Sonho meu, sentiu contusão.
Se viu perder, em confusão
Nas vagas inquietas da consternação.
Vejo-o agora morto, sem vida…
Sonho meu, se matou… suicida.
Não viu, do tormento saída…
E a vida deu como concluída.
Mil armas apontadas á cabeça,
E a infelicidade de nenhuma disparar.
Vegetativo… inútil…
Aqui me encontro eu, na decadência imensa de ser eu.
Não encontro em nada, um significado para tudo isto.
E deixo-me estar…
Dias tornados em noite.
Noites tornadas em trevas.
Sou subalterno, de meu estado sério.
Demasiado sério…
Não faço rir ninguém, e nada me faz rir.
Carrancudo por feitio, ou talvez por defeito.
A vida que por mim passa,
É-me, um enigma de difícil resolução.
E eu tenho-a pensado, tenho-a analisado.
Sem tirar conclusões.
Já nem grito…
Já nem sonho…
Enojo-me de mim,
Por ter em mim este pensar.
Talvez me odeie tanto,
Pelo simples facto de ser eu.
Talvez exista por aí…
Uma resolução fácil para meu dilema.
Mas exige coragem, e egoísmo.
E, corajoso, sou pouco…
E o egoísmo, pouco me diz.
Posto isto…
Resta, a permanência
Vegetativa, inútil, carrancuda,
Incompreensivelmente incompreendida
De ser eu, e de tudo o que isso acarreta.
Os escudos, jazem quebrados,
E dou-me por vencido.
Já não há dias encantados…
E o céu, esta enegrecido.
Ruínas de alegria…
Há muito abandonadas.
Sementes de agonia,
Em meu coração germinadas.
Indefeso, me mostro, a esta dor
Na calma amorfa de a sentir.
Fico só, em tremor
Ao ver á minha volta tudo a ruir.
Me abandona tudo resto,
Fica, a mágoa companheira…
Me sumo, me detesto…
Numa existência grosseira.
Liberto-me de fantasias,
Encarando a dura realidade.
Amargurados os meus dias,
Crivados de insanidade.
Já nem lambo as feridas,
Deixo-as tomar infecção.
Encarno figuras destorcidas,
De discípulo da desilusão.
Cada vez que falo…
Cada vez que escrevo…
Tenho tendência a deixar…
A deixar muito por dizer,
A deixar muito por escrever.
Fica-me sempre a impressão
Que os versos escritos, não estão acabados.
Uma forte convicção,
Que na conversa, nem todos os assuntos foram abordados.
Tento ser explícito e coerente…
Mas quando está “terminado”
Penso bem, e fico descontente…
Por algo ter ficado de lado.
Ironicamente…
Agora falo das palavras não escritas,
Agora escrevo sobre as frases que não foram ditas.
Foram… dezenas delas, centenas delas, milhares delas…
Até quem sabe… milhões delas…
Deixei mais por dizer, que o que disse…
Deixei mais por escrever, que o que escrevi.
Não consigo pensar no escuro…
Necessito de uma luz que alumie o pensamento.
Pensar no escuro, é pensar sem barreiras,
É a libertação, social e completa do ser.
É ir… não voltar e quebrar fronteiras.
É pensar, por pensar, sem ter nada a perder.
Sou guiado pela lógica e pela razão…
Pela minha lógica, e pela minha razão…
Mas até essas fazem parte
De um pensar comum.
Queria o engenho e a arte,
Para não ser só mais um.
Tombo em silencio, na imensidão iluminada,
Desolada de meu pensamento…
Eles têm as mãos e os pés atados.
Eles vivem… mas estão condenados.
Fingem ser livres, e abraçam a ilusão,
Fingem voar, sem tirar os pés do chão.
Consagram-se a si mesmos sem pudor,
E fazem aparentar, que entre si, há amor.
São traços errantes, obrados, por uma criança,
São a oferenda vã, que a besta amansa.
Negoceiam a vida e a morte,
Digladiando-se pelo azar e pela sorte.
Foram á lua, violaram o mar,
Sentem-se estranhos, em qualquer lugar.
Domaram tigres e leões,
Encheram-lhe os estômagos de vilões.
Mostram a cor dos dentes, em fingimento…
São lacaios supremos do arrependimento.
- Eu quero os campos conspurcados…
Quero as falésias, promontórios calcinados…
Quero os corpos dos amaldiçoados…
Seus sonhos e projectos malfadados.
Dêem-me as cinzas ainda quentes,
A inteligência dos descrentes…
O desleixo dos desobedientes,
A falsidade dos incoerentes.
Dêem-me o ódio e a maldade,
As pragas e a ruindade…
Dêem-me a crueldade…
Atulhada de perversidade.
Dêem-me…
Derramem em mim o mal da humanidade…
Dêem-me lixo,
Dêem-me os desperdícios…
Não me quero em crucifixo.
Quero precipícios.
Quero a amálgama, resultante do mau…
De tudo o que não se dá a um Deus.
Não quero pedras preciosas, quero o calhau…
Quero os males… que todos são meus.
Vi-me… fora de meu corpo,
Lá fora, correndo desgovernado.
Pisava o chão descalço…
Num acto tresloucado.
Inspirava ar…
Expirava demência,
Corria sem parar
Voando em imprudência.
Farto-me do tédio…
Mas, temo a mudança.
Queria um intermédio
Que equilibrasse a balança.
Os dias entediantes…
Massacram ao passar.
As mudanças angustiantes…
Fazem o mesmo, ao voltar.
E olho para mim…
De fora de meu corpo…